domingo, 27 de janeiro de 2013

O Estimulante da Madrugada

"O nome do blogger sempre foi bastante sugestivo, pois, a maioria dos meus textos foram escritos foram escritos em madrugadas, madrugadas as quais os pensamentos adiaram o sono invadindo a noite que foi feita para dormir.. Somos noturnas, boemias e regadas a cafeína... e todos que me conhecem sabem o quanto eu aprecio um cafezinho diário em boa companhia... então apreciem com moderação..."






"Um bom café deve ser: negro como a noite, quente como o inferno, doce como o amor"







Cá estou eu e a madrugada mais uma vez juntas...
Velhas conhecidas que somos, aprendemos a gostar muito uma da outra.
A hora do dia em que aprendi a gostar mais.
A hora do dia em que mais me encontro.
Seu cheiro me traz paz, seu silencio saudades..

Uma saudade intensa, do que eu ainda está por vir, uma saudade do novo dia que esta nascendo... 
É uma saudade do novo, do inesperado... por horas esta saudade se mistura com a ansiedade e consome minha madrugada de maneira devoradora..

Se tem chuva é ainda melhor... há quem não aceite esse meu jeito... diz que está errado, que meus horários estão trocados, pois eu deveria estar dormindo... mais eu não consigo... o sabor da madrugada me fascina demais...
Enquanto todos dormem eu continuo acordada e minha cabeça permanece trabalhando ágil sem parar... mesmo que eu não queira..

Eu me descubro na madrugada, e de maneira reciproca a madrugada me descobre... 
A solidão do meu quarto.
O silêncio do mundo parcialmente desligado.
O barulho da chuva se mistura com a guitarra do som de BB.King, e juntos me embalam em uma sinfonia única.
A fumaça invade meu quarto, dançando loucamente ao som do blues... já eu quando não acompanho sua dança, divago presa em pensamentos, em meus demônios... em minha mente..

O meu eu, que só eu entendo, insiste em me contradizer... 
Toda madrugada..

Aprendi a amá-la assim... meio que sem perceber... em companhia da cafeína... estimulante não só do corpo.. mais principalmente da mente...

by.: Lilian Ventura
Horário: 02:15




quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Homo consumens e o amor




                A sociedade contemporânea convive, quase que exclusivamente, com o homo consumens[i]; a vida consumista favorece a leveza e a velocidade. E também a novidade e a variedade que elas promovem e facilitam. É a rotatividade, não o volume de compras, que mede o sucesso na vida do homem contemporâneo. De que maneira a relação de consumo que estabelecemos com os produtos duráveis (que poderiam ter outro nome, pois eles não são duráveis) afetam a nossa capacidade de criar e cultivar vínculos humanos?
                A misteriosa fragilidade dos vínculos humanos, o sentimento de insegurança que ela inspira e os desejos conflitantes (estimulados por tal sentimento) de apertar os laços e ao mesmo tempo mantê-los frouxos, é um tema contemporâneo. (Paciência é uma virtude; que se faz essencial quando falamos em amor). Quase todas as discussões sobre “o problema” relacionamento (amor) nos dizem ser imprescindível a dedicação, o amor e o respeito. O respeito é, afinal, apenas um dos lados da faca de dois gumes da atenção, cuja a outra ponta é a opressão.
                Em todo amor há pelo menos dois seres, cada qual a grande duvida na equação do outro. É isso que faz o amor parecer um capricho do destino; aquele futuro estranho e misterioso, impossível de ser descrito antecipadamente, que deve ser realizado ou protelado, acelerado ou interrompido. Amar significa abrir-se ao destino, a mais sublime de todas as condições humanas, em que o medo se funde a alegria numa bagunça irreversível. Abrir-se ao destino significa, em última instância, admitir a liberdade no ser: aquela liberdade que se incorpora no outro, o companheiro no amor. A satisfação no amor individual não pode ser atingida sem a humildade, a coragem, a fé e a disciplina verdadeiras e em uma cultura na qual são raras essas qualidades, atingir a capacidade de amar será sempre, necessariamente, uma rara conquista. Sem humildade e coragem não há amor. Essas duas qualidades são exigidas, em escalas enormes e continuas, quando se ingressa numa terra inexplorada e não-mapeada. E é a esse território que o amor conduz ao se instalar entre dois ou mais seres humanos.
Quando se trata de amor, posse, poder, fusão e desencanto são os Quatro Cavaleiros do Apocalipse. Nisso reside à assombrosa fragilidade do amor, lado a lado com sua maldita recusa em suportar com leveza a vulnerabilidade. Todo amor empenha-se em subjugar, mas quando triunfa encontra a derradeira derrota. Todo o amor luta para enterrar suas fontes de precariedade e incerteza, mas, se obtém êxito, logo começa a se enfraquecer e definhar. Mãos que acariciam também podem prender e esmagar.
                (o amor pode ser, e frequentemente é, tão atemorizante quanto à morte. Só que ele encobre essa verdade com a comoção do desejo e do excitamento. Faz sentido pensar na diferença entre amor e morte como na que existe entre atração e repulsa; a tentação de apaixonar-se é grande e poderosa, mas também o é a tentação de escapar. E o fascínio da procura de um rosa sem espinhos nunca está muito longe, e é sempre difícil de resistir.)
                É como num shopping: os consumidores hoje não compram para satisfazer um desejo; compram por impulso. Semear, cultivar e alimentar o desejo leva tempo (um tempo insuportavelmente prolongado para os padrões de uma cultura que tem pavor em postergar, preferindo a “satisfação instantânea”). O desejo precisa de tempo para germinar, crescer e amadurecer. Numa época em que o “longo prazo” é cada vez mais curto, ainda assim a velocidade de maturação do desejo resiste de modo obstinado à aceleração. Os administradores de um shopping Center não desejam que as decisões de compra sejam tomadas por motivos nascido a e amadurecidos ao acaso, nem deixar seu cultivo nas mãos leigas dos consumidores. Todos os motivos necessários para fazê-los comprar devem nascer instantaneamente, enquanto passeiam pelo shopping.
                Nos dias de hoje, os shoppings centers tendem a serem planejados tendo-se em mente o súbito despertar e a rápida extinção dos impulsos, e não a incômoda e prolongada criação e maturação dos desejos. O único desejo que pode (e deve) ser implantado por meio da visita a um shopping é o de repetir, vezes e vezes seguidas, no momento estimulante de “abandonar-se aos impulsos” e permitir que estes comandem o espetáculo sem que haja cenário pré-definido. A curta expectativa de vida é o trunfo dos impulsos, dando-lhes uma vantagem sobre os desejos.
                Consideradas defeituosas ou não “plenamente satisfatórias”, as mercadorias podem ser trocadas por outras, as quais se espera que agradem mais, mesmo que não haja um serviço de atendimento ao cliente e que a transação não inclua a garantia de devolução do dinheiro. Mas, ainda que cumpram o que delas se espera, não se imagina que permaneçam em uso por muito tempo. Afinal, automóveis, computadores ou celulares perfeitamente usáveis, em bom estado e em condições de funcionamento satisfatórias são consideradas, sem remoço, como um monte de lixo no instante em que “novas e aperfeiçoadas versões” aparecem nas lojas e se tornam o assunto do momento. Alguma razão para que as parcerias sejam consideradas a exceção da regra?
(guiado pelo impulso “seus olhos se cruzam na sala lotada”, a parceria segue o padrão do shopping e não exige mais que as habilidades de um consumidor médio, moderadamente experiente. Tal como outros bens de consumo, ela deve ser consumida instantaneamente e usada uma só vez, “sem preconceito”. É, antes de mais nada, eminentemente descartável.)



[i] BAUMAN, Zygmunt. Vida Líquida.